Maria Antonieta e Willys na estufa
Maria Antonieta e Willys na estufa

Capítulo 07 – A ressaca da festa

O sol já atravessava preguiçoso as janelas da mansão quando Maria Antonieta abriu os olhos. O quarto ainda tinha o aroma suave das flores da noite anterior, mas em seu peito, a leveza de uma noite encantadora havia se transformado em um peso incômodo — uma mistura de cansaço e desalento.

A imagem de Willys ao lado de Mariana, tão seguro, tão tranquilo… ainda pulsava como um eco. E a pergunta martelava: seria possível que ele tivesse mesmo esquecido tudo? Ou, pior, que nada daquilo tivesse sido real, senão para ela?

Descendo para o café da manhã, encontrou Sara já à mesa. As duas trocaram um olhar que dispensava qualquer explicação. A festa havia deixado marcas, e nenhuma delas seria apagada com pão quente ou chá de jasmim.

— Vai ser um longo dia — disse Antonieta, tentando forçar um sorriso.

Sara apenas assentiu, respeitando o silêncio da prima.

Horas mais tarde, já na ala administrativa da propriedade, Antonieta revisava alguns relatórios e tentava organizar sua mente junto às planilhas. Os funcionários voltavam à rotina, e a mansão começava a respirar seus dias habituais.

Foi então que a porta se abriu com um leve bater… e o tempo pareceu estagnar.

Willys.

Impecavelmente trajado, sorriso discreto no rosto, e com um maço de papéis em mãos, como se absolutamente nada tivesse acontecido. Como se Paris, Mariana, os olhares cruzados e o silêncio incômodo da festa fossem apenas delírios de uma mente sensível demais.

— Senhorita Antonieta — disse com um leve aceno de cabeça — recebi uma nova agenda de manutenção da propriedade, e vim fazer os ajustes finais com a senhorita, como de costume.

Ela sentiu o coração acelerar, mas manteve-se firme. Levantou os olhos devagar, como quem encara um fantasma, mas com a altivez de quem não deixará transparecer.

— Claro, senhor Willys. — respondeu ela, friamente — Pode deixar os documentos sobre a mesa. Eu verei isso assim que possível.

Por um segundo, os olhos dele buscaram os dela. Havia um quê de hesitação, quase uma tentativa de romper o gelo. Mas Antonieta desviou o olhar e continuou mexendo em seus papéis.

— Mais alguma coisa?

— Não… nada mais. Com licença.

E ele se foi.

Quando a porta se fechou, Antonieta soltou o ar que segurava desde o momento em que ele apareceu. Aquilo doía mais do que um confronto direto. A indiferença, o fingimento… o mistério.

“Então ele teve mesmo a cara de pau.”, pensou. Mas junto à raiva, havia um sentimento pior: o da dúvida que agora reabria suas feridas.


Confabulações entre primas

Pouco tempo depois do inesperado encontro com Willys, Maria Antonieta caminhava pelos corredores da mansão como quem tenta sair de um sonho confuso. Estava indo em direção à biblioteca quando deu de cara com Sara, que a observou com uma expressão curiosa e atenta.

— Você está pálida… — disse a prima, baixinho, quase como um sussurro cúmplice — Aconteceu alguma coisa?

Antonieta hesitou, mas o olhar de Sara era o único lugar seguro no meio daquele mar revolto de pensamentos. Então, num impulso, puxou-a pelo braço e entraram juntas em um dos salões vazios.

— Ele voltou, Sara. Hoje. Como se nada tivesse acontecido.

— Ele…? — os olhos de Sara se arregalaram — Willys?!

Antonieta assentiu, os lábios trêmulos.

— Entrou no meu escritório com toda naturalidade. Trouxe papéis, falou do trabalho, me chamou de senhorita Antonieta como sempre… como se Paris jamais tivesse existido… como se aquela mulher — Mariana — não tivesse estado ao lado dele, dividindo olhares e… memórias que talvez nunca tenham sido minhas…

Sara sentou-se rapidamente, sentindo o peso da informação.

— E você disse alguma coisa?

— Nada. Fui cordial, fria, como se ele também fosse só um funcionário. Mas por dentro… eu desmoronei.

Sara a encarou por alguns segundos e depois falou, com a voz cautelosa:

— Você se lembra daquele nosso papo em Paris? Quando falei sobre o que vi no dia em que fiquei sozinha aqui? Sobre… tia Débora?

Antonieta assentiu, engolindo em seco.

— Pois bem… agora tudo está ainda mais confuso. Por um momento, eu pensei que pudesse estar enganada, mas depois da festa, depois daquela mulher ao lado dele… eu realmente não sei mais de quem estamos falando.

Antonieta a olhou fundo nos olhos.

— E se… — começou — E se aquele bilhete que tia Débora entregou no museu não fosse pra aquele estranho, mas pra ele? Pra Willys?

Sara arregalou os olhos. O nome dito assim, com aquela carga, com aquela hipótese… A dúvida pairava no ar, como uma sombra sem dono.

— Ou… — completou Antonieta, hesitante — …pra alguém como Stone?

Sara se levantou bruscamente, visivelmente nervosa com a menção. Seus olhos denunciaram o abalo.

— Por que você disse isso?

— Não sei. Me escapou. Foi só um pensamento bobo… como se houvesse dois lados de uma mesma pessoa… ou duas pessoas idênticas…

Sara desviou o olhar, tentando esconder sua inquietação.

— Talvez você só esteja… cansada. São muitas emoções. E ele, voltando assim… é cruel.

As duas se entreolharam em silêncio. Uma sabia mais do que estava disposta a dizer. A outra, sentia mais do que conseguia compreender. E no meio disso, Willys — ou Stone — era uma peça solta de um quebra-cabeça que insistia em não se revelar.


“Cevar o peixe”

As duas permaneciam em silêncio no salão, envoltas em pensamentos tão densos que mal percebiam o tempo passar. Sara, ainda intrigada com a menção ao nome “Stone”, olhava a prima com um misto de admiração e preocupação.

Maria Antonieta, por sua vez, parecia ter chegado a uma decisão. Respirou fundo, se recompôs na cadeira e, olhando fixamente para o vazio como quem traça mentalmente um mapa, finalmente falou:

— Sabe, Sara… eu decidi uma coisa.

A prima ergueu o rosto, atenta.

— Eu vou fingir. Fingir que nada aconteceu. Que aquela noite em Paris não existiu, que aquele bilhete nunca foi entregue, que Willys não voltou hoje como se tudo estivesse no lugar… Vou sorrir, cumprimentar, ser gentil, educada… como se eu fosse a mais ingênua das mulheres.

— Você vai… ignorar tudo?

Antonieta balançou a cabeça, negando com um sorriso enigmático.

— Não exatamente. Eu vou cevar o peixe. Esperar a hora certa, a isca perfeita. Quero vê-lo confiar, baixar a guarda. E quando isso acontecer, estarei pronta para saber a verdade. Não aceito mais viver no escuro. Mas também não quero verdades pela metade, arrancadas à força.

Sara arregalou os olhos, espantada com a frieza doce de Antonieta.

— Nunca te vi assim… tão determinada. Tão estrategista.

— Talvez porque eu tenha me cansado de ser só sentimento. Agora é minha vez de observar… e agir.

— E se doer ainda mais?

Antonieta sorriu com uma ponta de tristeza.

— Então doerá. Mas, desta vez, será uma dor com propósito. Uma dor que me levará a alguma verdade. E de alguma forma… isso já me alivia.

Sara a abraçou com ternura e admiração. Sabia que, a partir dali, sua prima estava se transformando. E que aquela doçura que sempre encantava os outros agora carregava um veneno elegante, destinado a revelar todos os segredos ocultos atrás dos sorrisos e dos silêncios de Willys… ou quem quer que ele fosse.


Capítulo – Os Primeiros Movimentos

A manhã seguinte amanheceu com o céu limpo e uma leve brisa que balançava as cortinas do quarto de Maria Antonieta. Ela despertou cedo, arrumou-se com cuidado, escolheu um vestido leve, de cor suave, e um perfume sutil. Queria parecer espontânea, natural… mas cada detalhe era friamente calculado.

Ao descer as escadas, o destino lhe sorriu: Willys – ou melhor, o chofer Willys – já a aguardava próximo ao carro, impecavelmente vestido, com aquela compostura quase formal que sempre o acompanhava.

— Senhorita Antonieta, para onde deseja ir hoje? – disse ele, abrindo a porta do carro com uma leve inclinação de cabeça.

Ela sorriu, serena.

— Ah, hoje tenho muitos lugares em mente… mas não se preocupe, vamos com calma. Começaremos pelo centro. Preciso visitar uma galeria e talvez fazer algumas compras.

Durante o trajeto, ela observava tudo. As mãos dele ao volante, os olhos que pouco desviavam da estrada, a forma polida com que respondia suas perguntas.

Mas agora, ela também falava mais. Não se escondia. Perguntava sobre caminhos, fazia breves comentários sobre a cidade, perguntava se ele já tinha ido a tal café, ou conhecido tal rua.

Ele respondia, sempre com educação, porém ainda um pouco contido.

Depois de algumas horas, pararam em frente à galeria. Willys a acompanhou até a entrada, e ela, antes de entrar, virou-se para ele:

— Acho que você deveria entrar comigo. Pode me ajudar a escolher uma peça especial. Estou pensando em presentear minha tia Débora…

Willys hesitou por um segundo, mas assentiu.

— Como desejar.

Antonieta sorriu, encantadora.

— Ótimo. Vai ser bom ter companhia… Você sabe, é sempre bom ouvir uma opinião sincera.

Durante o restante do dia, ela o envolveu em tudo. Pediu ajuda para carregar pacotes, opinou sobre perfumes, o convidou para tomar um café. E em cada momento, seus olhos analisavam, sua mente processava. Cada pausa antes de responder. Cada olhar desviado. Cada leve tensão nos ombros quando certos nomes ou lugares eram mencionados.

No fim do dia, de volta à mansão, enquanto ele desligava o carro, ela agradeceu com a doçura de sempre:

— Obrigada, Willys. Hoje foi um dia… inesperadamente agradável. Amanhã temos mais?

Ele assentiu, com um leve sorriso nos lábios.

— Estarei à disposição, senhorita Antonieta.

Ela saiu do carro com a graciosidade de sempre. Mas dentro de si, sentia-se mais firme do que nunca. O jogo havia começado. E ela seria paciente. Observadora. Silenciosa.

O peixe havia começado a ser cevado.


Ao Ataque

A tarde estava calma, com a brisa leve entrando pelas janelas da biblioteca. Antonieta havia pedido a Willys que a levasse ao campo para uma visita à estufa de flores da mansão – um lugar que ele mesmo já lhe mostrara certa vez, mas que ela agora dizia querer revisitar com novos olhos.

Durante o trajeto, o silêncio era confortável, mas tenso, como o intervalo entre um disparo e seu eco. Antonieta cruzou as pernas com elegância, arrumou delicadamente o cabelo e lançou o primeiro dardo:

— Sabe, Willys… fiquei encantada com Mariana na festa. Ela é realmente linda… doce… de uma elegância quase natural. Tão rara…

Willys manteve os olhos na estrada, mas um leve sorriso surgiu no canto de seus lábios.

— Ela é mesmo. Mariana é muito especial… na vida da nossa família, sabe? – respondeu com naturalidade, a voz sem hesitação.

Antonieta virou lentamente o rosto na direção dele. “Nossa família”? A frase soou com um eco curioso. Foi sutil, mas não passou despercebida por sua mente afiada. Ele não disse “minha família”, nem “minha amiga”… disse “nossa”. A escolha do plural soava quase ensaiada… ou muito íntima.

Ela então lançou a segunda flecha, com um sorriso inocente:

— Há uma ternura no olhar dela… sabe aquela doçura que quase não se vê mais?

Ele olhou rapidamente pelo retrovisor, como se conferisse se estavam realmente sozinhos. Depois, lançou-lhe um olhar sereno, mas firme.

— Ela tem, sim. Uma doçura que me lembra a sua, senhorita Antonieta…

As palavras pairaram no ar. O mundo pareceu ficar em silêncio por alguns segundos.

Ela arregalou os olhos, não esperava o contra-ataque. Um leve rubor subiu às suas bochechas, e ela desviou o olhar pela janela, sentindo-se… tocada.

Era um elogio singelo, mas cheio de intenções ambíguas. E ainda mais intrigante: ele sequer hesitou.

Antonieta sorriu de lado, fingindo leveza, mas por dentro… uma pequena labareda se acendeu. Talvez ela não estivesse enfrentando um peixe comum, e sim um estrategista silencioso, tão bom em disfarçar quanto ela.

Chegaram à estufa.

— Vamos? – ele perguntou, abrindo a porta para ela com aquele velho cavalheirismo.

— Claro… – respondeu ela, com os olhos semicerrados. Vamos sim, Willys… mas o jogo está apenas começando…


Ainda na estufa…

Entre as pétalas delicadas das orquídeas e o perfume suave das rosas recém-desabrochadas, Antonieta caminhava devagar, tocando levemente algumas flores com a ponta dos dedos. O ambiente era quase mágico — o som distante dos pássaros, a luz dourada entrando pelos vidros da estufa, e o silêncio que dizia mais que palavras.

Ela sorriu contemplativa e falou com doçura:

— As flores são tão diferentes umas das outras… mas todas têm sua beleza. É difícil escolher a mais bonita, não acha?

Willys, que a observava de perto enquanto caminhava atrás dela, respondeu com um tom calmo:

— Algumas flores chamam a atenção de imediato. Outras, só revelam sua beleza quando a gente para de verdade pra olhar…

Ela parou ao lado de uma flor exótica, de cor vibrante, e virou-se para ele com um ar levemente curioso:

— E… já que estamos falando de beleza… me diga: qual o lugar mais lindo que você já conheceu?

Antonieta fez a pergunta com aquele brilho malicioso nos olhos, certa de que ele mencionaria Paris — talvez uma lembrança da viagem, um ponto de ligação entre eles.

Mas ele sorriu levemente e respondeu, surpreendendo-a:

— Nunca estive em Paris.

Ela arqueou as sobrancelhas, quase sem acreditar.

— Nunca?

— Nunca. E, pra ser sincero… não tenho vontade.

Ela tentou esconder a surpresa, mas antes que pudesse reagir, ele deu um passo à frente. O olhar dele era firme, direto, mas sereno. Aquele olhar que dizia mais que qualquer poema, e que pousou sobre ela com uma intensidade desconcertante.

— Porque o lugar mais bonito que já conheci… é exatamente onde eu estou agora.

Ela sentiu o coração dar um salto. Ficou sem palavras. O ar pareceu rarefeito por um instante. Ele não sorriu. Não havia galanteio. Era apenas uma verdade… nua, calma e cortante.

Antonieta desviou o olhar por reflexo, mexendo em uma flor próxima, tentando disfarçar o impacto. Mas por dentro… estava em chamas.

E quando voltou os olhos para ele, encontrou aquele mesmo olhar calmo, mas que agora parecia guardar um segredo — ou uma promessa.


Mais tarde, sozinha em seu quarto…

Antonieta se sentou à beira da cama, os olhos fixos na janela onde o sol começava a se despedir, tingindo o céu com tons de lavanda e ouro.

O coração ainda batia mais forte do que o normal. A voz de Willys — ou seja lá quem ele fosse de verdade — ecoava na sua cabeça como uma canção sussurrada:
“O lugar mais bonito que já conheci… é exatamente onde eu estou agora.”

Ela se abraçou, tentando conter o turbilhão de sensações. A dúvida voltava a assombrá-la. Quem era ele afinal? Um farsante encantador? Um homem dividido entre duas realidades? Ou alguém tão misterioso que nem mesmo ela, com toda sua sensibilidade, conseguia decifrar?

Mas havia uma certeza… ele mexia com ela. Como ninguém jamais fez.

E isso era tão perigoso quanto irresistível.


No dia seguinte, com Sara, em um banco do jardim…

— Eu estou te dizendo, Sara… ele me desmonta com aquele olhar calmo. E o pior é que ele não diz nada concreto, mas cada palavra parece ter uma segunda camada… como se estivesse sempre me testando — desabafou Antonieta, jogando as costas no encosto do banco.

Sara a observava com um ar de leve divertimento.

— E você tá jogando o jogo dele. Fingindo que nada sabe. Fofinha, mas perigosa…

Antonieta sorriu de canto, mas o olhar era sério.

— Você me conhece. Eu não sou de correr. Mas também não sou de me entregar fácil. Eu tô cavando fundo, Sara… e ele vai ter que mostrar quem é. Nem que seja aos poucos.

— E a Mariana? Ainda acha que é namorada dele?

— Claro que acho! Ele nunca negou! E você viu a forma como ele falou dela ontem… “uma pessoa muito especial na vida deles”. No plural. Quem mais está incluído nesse “deles”? Isso não me saiu da cabeça!

 

Em ordem: Willys, Maria Antonieta, Sara e Mariana
Em ordem: Willys, Maria Antonieta, Sara e Mariana

Sara mordeu o lábio inferior, pensativa.

— Então você vai continuar essa caçada… fingindo que tá tudo bem, enquanto cava cada centímetro?

Antonieta olhou firme para ela e respondeu com um sorriso afiado:

— Eu não vou só cavar, Sara. Eu vou plantar. E quando a verdade brotar… quero estar pronta pra colher.


Confissões & Conjecturas

Ainda no jardim, o sol já mais alto entre as folhas, as duas primas continuavam a conversa entre confissões e conjecturas…

Antonieta balançava levemente uma flor entre os dedos, distraída, mas com o olhar firme.

— Te contei do que falei com ele ontem na estufa?

— O quê? — Sara perguntou, inclinando-se curiosa.

— Perguntei qual era o lugar mais bonito que ele já esteve. Achei que ele fosse dizer Paris… seria natural, né? Mas ele me surpreendeu. Disse que nunca esteve em Paris. E completou dizendo que nem pretende conhecer…

Sara arregalou os olhos.

— Como assim? Ele negou ter estado em Paris?! — disse, visivelmente surpresa.

— Exatamente. Com todas as letras. E depois… — Antonieta hesitou, buscando nas palavras um equilíbrio — …disse olhando nos meus olhos, com aquela calma que irrita e fascina ao mesmo tempo, que o lugar mais bonito que ele já conheceu era onde ele estava naquele momento.

— Ah não, isso é golpe!, Antonieta! — exclamou Sara, quase rindo — Isso é frase de quem lê livros de romance barato! Tô te dizendo… ele tá te enredando.

Antonieta sorriu, mas seus olhos mostravam que estava longe de se deixar levar.

— Pode até ser… mas se é golpe, Sara, ele ensaiou bem. Porque na hora… eu acreditei. Acreditaria de novo se me olhasse daquele jeito.

Sara ficou em silêncio por um instante, depois deu um leve tapa no braço da prima.

— Acorda, mulher! Estamos falando do mesmo cara que talvez… talvez esteja envolvido com a sua tia! Não esquece disso.

Antonieta assentiu lentamente.

— Eu não esqueço. Mas é como se houvesse dois dele… o que eu vi com Débora — ou pensei que vi — e esse que agora tenta me encantar… São peças que ainda não se encaixam, Sara. Mas eu vou montar esse quebra-cabeça.

Sara cruzou os braços, observando a prima com carinho e desconfiança.

— Só não deixa que ele te use como peça, Antonieta. Você não é parte do jogo, você é quem deve mover as jogadas.

Antonieta olhou para o céu e suspirou.

— Ainda não sei se ele é o jogo ou se é a chave…


O alerta de Sara – A bela Mariana…

Sara balançou a cabeça, ainda digerindo as palavras da prima.

— Antonieta… — disse num tom mais sério — Você tá mexendo com fogo. E não é só por esse olhar poético e cheio de mistério que ele lança de vez em quando. Tem mais coisa aí…

Antonieta se virou para ela, atenta.

— Como assim, Sara?

Sara respirou fundo, cruzando os braços com firmeza.

— Além da história mal contada de Paris, da sua tia Débora, dos bilhetes misteriosos… ainda tem a bela Mariana! — disse com ênfase — Aquela mulher não é só bonita, ela é do tipo que parece esconder um segredo. E olha como ela anda grudada nele, como se fosse um porto seguro… ou pior, como se soubesse de tudo.

Antonieta engoliu em seco, desviando os olhos por um instante.

— Eu sei… e quando elogiei a Mariana, ele disse que ela era uma pessoa muito especial na vida deles. Usou o plural, Sara! E depois… disse que eu tinha a mesma doçura dela. Como se…

— Como se vocês duas fossem parte do mesmo círculo íntimo? — completou Sara, apertando os olhos. — Ou como se tivesse tentando manipular seus sentimentos aos poucos…

— Sim! É como se ele estivesse plantando em mim uma ilusão… — disse Antonieta, com um nó na garganta.

Sara se aproximou e segurou as mãos da prima.

— Escuta o que eu vou te dizer: fica esperta. Não entrega o coração por inteiro. Observa, testa, espera. Porque se ele for mesmo quem parece ser… vai se revelar sem que você precise se machucar mais.

Antonieta assentiu lentamente, apertando as mãos da prima com gratidão.

— Eu vou seguir o seu conselho, Sara. Mas vou seguir do meu jeito… jogando como ele joga.

Sara sorriu de lado.

— Pois jogue, mas jogue para vencer. Porque dessa vez… o prêmio é o seu coração.


Pequeno Teste!

Na tarde seguinte, Antonieta teve uma ideia precisa — precisava vê-los juntos, em movimento natural, sem que percebessem estar sendo observados.

Ela esperou o momento certo e então, de forma casual, comentou com Willys que gostaria de ir até o campo de lavanda para um ensaio fotográfico entre as flores — algo que sabia que ele não recusaria.

— Seria bom ter ajuda, talvez Mariana possa ir também… — disse com suavidade, como quem não queria nada, observando discretamente sua reação.

— Claro — respondeu ele, sorrindo com naturalidade. — Mariana adora flores. Ela vai gostar.

Pronto. Estavam todos no carro, e Mariana, como sempre, exalava charme e graça. Mas Antonieta estava atenta a cada gesto, cada palavra trocada, cada olhar.

O campo de lavanda estava deslumbrante naquele fim de tarde dourado. A brisa leve fazia dançar os tons lilases, e o cenário era perfeito para as intenções de Antonieta. Ela havia planejado tudo com maestria e sutileza. Queria observar a relação entre Willys e Mariana sem filtros.

No trajeto até lá, os dois conversavam como velhos conhecidos. Mariana ria das piadas de Willys com espontaneidade, e ele a olhava com um carinho evidente. Às vezes, ajeitava uma mecha do cabelo dela com delicadeza; noutras, tocava-lhe o ombro com naturalidade, como quem conhece cada expressão do outro.

Ao chegarem, Willys foi gentil com ambas, mas era com Mariana que os gestos mais doces se revelavam. Quando ela comentou que estava com frio, ele tirou o casaco e a envolveu sem pensar duas vezes. Mariana agradeceu com um beijo estalado na bochecha, daqueles longos, seguidos de um sorriso cúmplice.

Depois, foi ela quem, ao vê-lo distraído observando o pôr do sol, chegou de mansinho e deu-lhe um beijo na testa, suave, como quem sela uma memória querida.

Antonieta observava tudo com o coração em chamas — mas a mente racional se debatia.

“Será que é assim que casais apaixonados agem… ou seria algo mais fraternal? Poderiam ser irmãos? Ou isso é só o tipo de intimidade que vem de um amor escondido?”

Eles riam de coisas que só os dois entendiam, trocavam olhares cúmplices e pequenos toques… e cada um desses gestos era como uma flecha invisível que acertava Antonieta em cheio.

Ela forçou um sorriso, tentando disfarçar o incômodo.

— Vocês parecem se dar muito bem… — comentou, casualmente.

— Ah, Mariana é muito especial — respondeu Willys, olhando com ternura para a moça. — Sempre foi.

— Sempre? — repetiu Antonieta, tentando esconder o tom curioso por trás de um sorriso leve.

— Desde que nos conhecemos… parece que já havia um laço ali, sabe?

Antonieta sorriu de volta, mas por dentro um furacão de dúvidas girava furiosamente.

“E se forem apenas amigos íntimos? Ou irmãos de consideração? Ou será que… será que ele a ama de verdade e está apenas me iludindo com essa gentileza disfarçada?”

O caminho de volta foi silencioso para Antonieta. As palavras de Willys se repetiam em sua mente como um eco provocador.

E ao descer do carro, ele ainda se inclinou e deu um beijo afetuoso no topo da cabeça de Mariana, que retribuiu segurando sua mão com delicadeza antes de entrarem na mansão.

Sara, que observava de longe, não precisou de palavras para entender o estado da prima. Aproximou-se de Antonieta com uma sobrancelha arqueada.

— E então? O que achou da química entre os dois?

Antonieta demorou a responder. Depois sussurrou, com os olhos baixos:

— Eu… não sei. Mas se for o que parece… meu coração não vai aguentar.

O campo de lavanda estava deslumbrante naquele fim de tarde dourado. A brisa leve fazia dançar os tons lilases, e o cenário era perfeito para as intenções de Antonieta. Ela havia planejado tudo com maestria e sutileza. Queria observar a relação entre Willys e Mariana sem filtros.

No trajeto até lá, os dois conversavam como velhos conhecidos. Mariana ria das piadas de Willys com espontaneidade, e ele a olhava com um carinho evidente. Às vezes, ajeitava uma mecha do cabelo dela com delicadeza; noutras, tocava-lhe o ombro com naturalidade, como quem conhece cada expressão do outro.

Ao chegarem, Willys foi gentil com ambas, mas era com Mariana que os gestos mais doces se revelavam. Quando ela comentou que estava com frio, ele tirou o casaco e a envolveu sem pensar duas vezes. Mariana agradeceu com um beijo estalado na bochecha, daqueles longos, seguidos de um sorriso cúmplice.

Depois, foi ela quem, ao vê-lo distraído observando o pôr do sol, chegou de mansinho e deu-lhe um beijo na testa, suave, como quem sela uma memória querida.

Antonieta observava tudo com o coração em chamas — mas a mente racional se debatia.

“Será que é assim que casais apaixonados agem… ou seria algo mais fraternal? Poderiam ser irmãos? Ou isso é só o tipo de intimidade que vem de um amor escondido?”

Eles riam de coisas que só os dois entendiam, trocavam olhares cúmplices e pequenos toques… e cada um desses gestos era como uma flecha invisível que acertava Antonieta em cheio.

Ela forçou um sorriso, tentando disfarçar o incômodo.

— Vocês parecem se dar muito bem… — comentou, casualmente.

— Ah, Mariana é muito especial — respondeu Willys, olhando com ternura para a moça. — Sempre foi.

— Sempre? — repetiu Antonieta, tentando esconder o tom curioso por trás de um sorriso leve.

— Desde que nos conhecemos… parece que já havia um laço ali, sabe?

Antonieta sorriu de volta, mas por dentro um furacão de dúvidas girava furiosamente.

“E se forem apenas amigos íntimos? Ou irmãos de consideração? Ou será que… será que ele a ama de verdade e está apenas me iludindo com essa gentileza disfarçada?”

O caminho de volta foi silencioso para Antonieta. As palavras de Willys se repetiam em sua mente como um eco provocador.

E ao descer do carro, ele ainda se inclinou e deu um beijo afetuoso no topo da cabeça de Mariana, que retribuiu segurando sua mão com delicadeza antes de entrarem na mansão.

 

Sara e Maria Antonieta observam Mariana e Willys em um gesto carinhoso
Sara e Maria Antonieta observam Mariana e Willys em um gesto carinhoso

Sara, que observava de longe, não precisou de palavras para entender o estado da prima. Aproximou-se de Antonieta com uma sobrancelha arqueada.

— E então? O que achou da química entre os dois?

Antonieta demorou a responder. Depois sussurrou, com os olhos baixos:

— Eu… não sei. Mas se for o que parece… meu coração não vai aguentar.


Mais tarde naquela noite…

O silêncio da casa era apenas quebrado pelo leve som de uma brisa que balançava as cortinas. Antonieta estava sentada na beirada da cama, ainda com os olhos perdidos, e Sara entrou com sua expressão característica: entre preocupada e perspicaz.

— Tá me parecendo que aquela carona te deixou mais tonta do que qualquer vinho francês — disse, tentando quebrar o gelo.

Antonieta soltou um leve sorriso, mas não era de humor, era de cansaço emocional.

— Sara… eles têm uma coisa. Eu não sei o quê, mas têm.

— Quem? — Sara sentou-se ao seu lado, mesmo já sabendo a resposta.

— O Willys e a Mariana… ou Stone, sei lá… — ela passou as mãos nos cabelos, frustrada. — Eles se tocam como se fossem de um filme romântico. Os beijos no rosto, o jeito que falam baixinho um com o outro… Não tem como aquilo ser só amizade.

— Pode ser um tipo de amor… mas não necessariamente romântico — ponderou Sara. — Já pensou que eles podem ter uma história antiga? Irmãos de criação, talvez? Ou até primos muito próximos?

Antonieta negou com a cabeça.

— Se fossem primos, alguém já teria comentado. E se fossem irmãos… sei lá, eles não falam isso abertamente. É sempre um “ela é especial”, “desde que nos conhecemos”… tudo muito vago. Como se escondessem uma verdade.

Sara a olhou com carinho e pegou suas mãos.

— Você está sofrendo por ele, não está?

Antonieta respirou fundo. Seus olhos marejaram.

— Eu queria dizer que não… mas sim. E sabe o pior? Eu me sinto ridícula. Porque se ele está com ela, ele nunca me deu falsas esperanças, foi sempre respeitoso, atencioso… Mas quando ele olha nos meus olhos, eu sinto alguma coisa. Juro que sinto.

Sara se levantou, começou a andar pelo quarto, refletindo.

— Então vamos fazer o seguinte: a gente vai investigar. Devagar, com inteligência. Vamos observar mais. Se eles estiverem juntos, você terá que aceitar e seguir. Mas se não estiverem… então, minha cara prima, a guerra está apenas começando.

Antonieta soltou um riso abafado e olhou para Sara com gratidão.

— E se eu estiver me iludindo?

— Então eu estarei aqui pra te dar colo — disse Sara, voltando para abraçá-la. — Mas se você estiver certa… vamos descobrir. E aí, meu bem, que se prepare o coração dele.

Alguns dias depois…

Era uma tarde nublada, e a mansão parecia envolta em um silêncio calmo, quase solene. Antonieta, sozinha na biblioteca, procurava um livro para distrair a mente. Queria algo leve, romântico talvez — uma ironia diante de tudo que vivia.

Ao abrir um dos volumes antigos de poesia, uma folha dobrada caiu de dentro. Era um papel de carta fino, com uma leve marca de perfume. O coração de Antonieta acelerou. Ela se abaixou para pegá-lo, hesitando antes de desdobrá-lo.

E então leu:

— “Não sei o momento exato em que meus olhos passaram a buscá-la no silêncio das minhas manhãs,
nem quando seus gestos simples começaram a ecoar em minha memória com tanta ternura.

Sei apenas que sua presença transformou meus dias.

É no seu sorriso que encontro a paz que nunca soube explicar.

Você é a mais doce confusão que o destino me ofereceu.

E ainda assim, não tenho coragem.

Não posso dizer seu nome.
Não posso dizer o que sinto.
Não posso tocá-la com a verdade que arde em mim.

Mas se um dia meus olhos traírem meu silêncio…
espero que você entenda que foi amor desde o começo.

— W”

Antonieta segurava o papel como se fosse feito de vidro. Seu coração batia forte, uma mistura de esperança e medo. O “W” final a deixou em transe. Poderia ser Willys… ou até mesmo Stone. Ou seria apenas uma coincidência cruel do destino?

Ela releu a carta três vezes, decorando cada linha, como se ao fazê-lo pudesse descobrir um segredo entre as palavras. O tom era íntimo demais, profundo demais… verdadeiro demais para ser só uma invenção.

Fechou os olhos e se perguntou:

— Seria pra mim?

Mas a dúvida logo sussurrou outra pergunta:

— Ou seria pra ela?


Antonieta dobrou cuidadosamente a carta, como se fosse feita de seda, e a guardou no fundo de sua gaveta, entre lenços antigos e um pequeno relicário de sua infância. Aquilo era seu. Apenas seu. Nem mesmo Sara saberia — ao menos por enquanto.

Ela sabia que dividir a descoberta com a prima traria alívio, talvez até conselhos… Mas algo dentro dela dizia que aquele bilhete era mais do que apenas palavras doces: era uma peça chave de algo maior. Algo que ainda precisava ser desvendado com cautela.

Os olhos voltaram ao espelho sobre a penteadeira. Viu-se diferente. Mais firme, mais atenta. Havia sido ingênua até ali, mas agora seria outra mulher. Não deixaria mais que as dúvidas a levassem à beira da loucura — iria caçar a verdade, passo a passo.

E enquanto a brisa suave entrava pela janela, tocando o papel que ainda parecia pulsar com as palavras escritas, ela sussurrou para si mesma:

— Se essa carta for para mim… ele vai ter que provar.


VEJA O OITAVO CAPÍTULO DO ROMANCE…