Capítulo 13 – Últimas Pendências… (Final)

A Elegância do Silêncio

As horas que antecederam o Réveillon foram marcadas por uma quietude disfarçada. O burburinho dos salões ecoava pelos corredores, misturado ao som refinado do quarteto de cordas que tocava clássicos franceses perto da lareira principal.

Maria Antonieta caminhava devagar por entre os convidados, admirando cada detalhe da mansão que parecia mais um cenário de ópera. As paredes decoradas com tapeçarias antigas, os retratos da família Sgarden espalhados com orgulho — tudo carregava uma aura antiga, quase teatral.

Ela usava um vestido de seda verde-musgo, que realçava seus olhos e sua sobriedade delicada. Sentia-se parte de algo maior, como se o destino a tivesse colocado ali para finalmente costurar o tecido solto da verdade.

Mariana aproximou-se, oferecendo-lhe uma taça de espumante.

Essa casa tem cheiro de segredos... — disse em tom baixo, sorrindo com os olhos.

E talvez seja aqui que eles comecem a se revelar. — respondeu Antonieta.

Ambas brindaram silenciosamente, em um gesto que selava uma nova cumplicidade entre as duas.

Do outro lado do salão, Willys conversava com Eugène Skills e um dos Sgardem. Estava elegante em um terno escuro, o cabelo cuidadosamente penteado, mas seus olhos sempre retornavam para Antonieta, como se procurassem se certificar de que ela ainda estava ali, naquele mundo estranho e sofisticado que ele jamais sonhou pertencer.

Débora deslizava entre os convidados como uma peça central de porcelana. O riso dela parecia mais alto do que deveria, e seus olhos percorriam os rostos como se buscassem algo — ou alguém. Quando passou por Antonieta e Mariana, seu sorriso vacilou por um segundo. Mas logo retomou a postura, como uma bailarina diante da plateia.

Na biblioteca, Sara folheava distraidamente um livro antigo apenas para se manter longe das multidões. Seu olhar atento, porém, não perdia nada. Quando viu Stone saindo por uma porta lateral com uma expressão carregada, algo em seu estômago se revirou.

Lá fora, a neve cobria os jardins, os pinheiros e as esculturas do pátio em um silêncio quase sagrado. Era como se o tempo estivesse em suspenso, aguardando o instante certo para o próximo movimento.

Na torre do relógio, os ponteiros se aproximavam da meia-noite. Mas antes das taças se erguerem, antes da contagem regressiva, antes dos fogos…

…as peças estavam se posicionando.

O coração de Antonieta já sabia: naquela noite, Paris não celebraria apenas um novo ano. Mas o fim de um passado oculto — e o início de uma verdade que mudaria tudo.


Entre Olhares e Silêncios

O salão principal estava mais movimentado. As luzes refletiam nos cristais dos lustres e no brilho discreto das joias, mas Willys não enxergava mais nada disso. O som da música, o tilintar de taças, os risos refinados… tudo se apagava cada vez que seu olhar encontrava o dela.

Antonieta estava perto da lareira, observando um retrato antigo da família Sgardem. Seu rosto sereno contrastava com a inquietação do coração. Ela sentiu, sem precisar olhar, que Willys se aproximava.

Eles parecem felizes, não é? — disse ele, apontando discretamente para o quadro.

Talvez fossem. — respondeu ela, com um leve sorriso. — Mas nem toda pose de família conta a verdade.

Ele concordou em silêncio, depois estendeu a mão.

Venha. Quero lhe mostrar uma coisa.

Ela hesitou por um segundo, mas aceitou. Caminharam juntos por um corredor decorado com espelhos antigos até uma pequena varanda envidraçada. Dali, a vista de Paris coberta de neve parecia uma pintura viva.

Quando eu era criança, — começou ele, apoiando-se no parapeito — costumava imaginar que um dia estaria em lugares assim. Mas nunca pensei que estaria com alguém como você.

Ela o olhou, os olhos úmidos de emoção contida.

E eu… pensei que você pertencesse a outro tempo. A outra mulher. A outro destino.

Ele abaixou os olhos, depois voltou a fitá-la, mais firme.

A carta. O poema. Os silêncios. Foram todos para você, Antonieta. Sempre foram.

Ela respirou fundo, como se estivesse liberando anos de confusão.

Eu temi Mariana… temi Débora… temi até o que não conhecia em você. Mas agora… só temo que tudo isso não seja real.

Ele se aproximou, devagar, os olhos presos aos dela.

É real. Tão real quanto essa noite… e essa escolha.

Sem dizer mais nada, ele pegou sua mão e a levou ao peito, sobre o coração. Ela pôde sentir: era ali que ela morava.

O relógio distante soou as primeiras badaladas de meia-noite.

Do lado de fora, os fogos começaram a pintar o céu.

Mas naquele instante, o tempo parou — só para os dois.


No Coração da Noite

As portas douradas do salão principal foram abertas com elegância. Um dos mordomos discretamente anunciou o pedido do anfitrião:

Atenção, senhores convidados. O senhor Sgarden deseja a presença de todos no centro do salão para um breve pronunciamento.

As conversas cessaram aos poucos. As risadas se transformaram em sorrisos curiosos. Um a um, os convidados se reuniram sob o lustre central, cujos cristais pendentes dançavam com o reflexo das luzes suaves. A neve caía delicadamente além das janelas de vidro, como se até ela tivesse sido convidada a assistir.

Maria Antonieta, de mãos dadas com Willys, aproximou-se sem pressa. Seus olhos brilharam ao ver toda a família reunida ali: os Skills, os Valmont, Sara e seus pais, os Sgarden, e convidados de todos os cantos de Paris.

Senhor Sgarden tomou a palavra com uma taça em mãos e um sorriso sincero.

Minhas senhoras, meus senhores… Esta noite não é apenas a celebração de um novo ano, mas da união de histórias, de reencontros inesperados, e de corações que, mesmo sob o frio do inverno, aprenderam a florescer novamente.

Houve aplausos suaves, alguns sorrisos emocionados.

Muitos de nós chegamos até aqui com bagagens pesadas — perdas, segredos, medos. Mas vejo em cada rosto agora a promessa de algo novo. De paz. De amor verdadeiro…

Enquanto ele falava, algo extraordinário acontecia pelas bordas do salão.

Sara, distraída, virou-se para buscar uma taça de champanhe… e foi nesse instante que seus olhos cruzaram com os de um homem elegante, de traços firmes, olhar misterioso — como se soubesse exatamente quem ela era. Um arrepio a percorreu. Ele se aproximou com reverência.

Estava esperando por você há anos… — disse ele, com voz profunda. Sara não respondeu — seu coração já havia dito tudo.

Poucos passos adiante, Mariana, que sorria discretamente ao lado de Antonieta, virou-se ao sentir um leve toque no ombro. E ali estava ele: um jovem artista convidado pela família Sgarden, de olhar tímido e alma intensa. Ele segurava um pequeno caderno de desenhos… com um retrato inacabado de Mariana em uma página.

Eu nunca sou soube seu nome… mas guardei seu rosto desde aquela tarde no Louvre… — confessou ele, e Mariana, tomada de emoção, sorriu como nunca antes.

Enquanto isso, Antonieta apertou a mão de Willys.

Ele a olhou com ternura e disse em voz baixa:

A noite está apenas começando… mas algo dentro de mim já encontrou seu fim: o de todas as dúvidas. Agora só existe você.

Antonieta fechou os olhos por um breve instante. E quando os abriu, sabia: o amor, por mais difícil que fosse, havia vencido.


As Revelações de Paris

O salão estava aquecido pela atmosfera de encanto, e o discurso do Senhor Sgarden ainda ecoava nos corações quando Débora, com sua elegância natural, se adiantou.

Vestia um vestido de veludo vermelho profundo, com os cabelos soltos como ondas de noite. Pegou o microfone com firmeza e um sorriso misterioso.

Antes que a noite termine, quero compartilhar algo com todos vocês. Algumas revelações importantes marcarão esta virada de ano…

Um leve murmúrio percorreu o salão. Os olhares se encontraram em busca de pistas, e os corações aceleraram.


1. O Noivado de Olivia

Débora sorriu para o canto do salão e sinalizou para Olivia, que surgiu entre os convidados com um brilho incomum no olhar. Ela pegou o microfone com as mãos levemente trêmulas.

Gostaria de dizer que estou noiva… e me casarei em breve com o homem que mudou minha vida: William Stone.

Um breve silêncio tomou o salão antes que os aplausos irrompessem. Mas, enquanto todos celebravam, os olhos de Willys congelaram. O sorriso dele se perdeu.

Olivia… era ela. A noiva que o abandonara no altar, que fugira com um estranho. A memória de Paris, da dor, das cartas sem resposta — tudo voltou com força devastadora.


2. A Reconexão com o Passado

Willys manteve a postura, mas seus olhos encontraram os de William Stone, que agora subia ao palco ao lado da noiva.

Eu… não sabia do passado de Olivia com Willys até muito recentemente, — disse ele, em voz clara. — Mas o que posso afirmar é que o amor entre nós aconteceu à primeira vista. Sem trapaça, sem intenção de ferir. Foi destino.

Willys apenas assentiu. A mágoa ainda existia, mas o tempo e o amor verdadeiro que ele agora conhecia ao lado de Maria Antonieta haviam suavizado todas as dores.


3. O Segredo de Débora

Sara, Antonieta e Débora trocaram um olhar silencioso. A verdade sobre o caso entre Débora e William Stone seria enterrada ali, selada entre elas.

— Algumas verdades não precisam ser ditas… — disse Débora, em tom simbólico, olhando para as primas com cumplicidade. — O que importa é o que permanece, e o que transforma. E esta noite é sobre novos começos.


4. A Herança Revelada

Foi então que William Stone ergueu uma pasta escura e a abriu com calma.

Nos últimos dias de vida, nosso pai nos procurou. Willys. Mariana. Eu. — Ele olhou diretamente para os dois. — E deixou registrado, em cartório francês, um testamento. Uma herança milionária destinada igualmente a nós três.

Um sussurro correu entre os convidados. Mariana levou a mão à boca, emocionada. Willys encarou o irmão, ainda atônito. Antonieta segurou sua mão com força.

A família Valmont, enfim, estava completa. Reconhecida. Honrada.


5. A Confissão de Maria Antonieta

Com os olhos brilhando e o coração em paz, Maria Antonieta se aproximou do centro. Pegou o microfone com firmeza, e uma leve emoção tomou sua voz.

Nesta noite de revelações, não posso esconder a minha. — Ela olhou para os pais, para os convidados, e enfim para Willys. — Entre tantos segredos, encontrei a verdade mais simples e mais arrebatadora da minha vida.

Fez-se silêncio absoluto.

Conheci o grande amor da minha história. Um amor que começou com flores deixadas no jardim, com cartas sem nome, com o mistério de um olhar silencioso… E agora posso dizê-lo sem medo: seu nome é Willys Emanuel Valmont.

O salão explodiu em aplausos, mas Willys apenas a abraçou. Ali, no centro do mundo, ele era apenas dela. E ela, dele.

E quando o relógio bateu meia-noite, entre taças erguidas, flocos de neve e promessas eternas, o amor finalmente venceu todos os mistérios.


Epílogo: Onde o Amor Floresce

O inverno parisiense parecia mais ameno naquela manhã de janeiro. A neve já não pesava sobre os telhados, mas parecia desenhar sobre eles versos silenciosos de uma história recém-concluída.

Na estufa da casa dos Sgarden — agora silenciosa após os festejos do réveillon — duas xícaras de chá repousavam sobre uma mesinha de madeira rústica. Ao lado, o manuscrito de um novo poema, com a letra firme de Willys Valmont, e os traços delicados da caligrafia de Maria Antonieta.

Ela tocava as flores com a leveza de quem conhece o valor de cada raiz, e ele a observava com os olhos de quem, enfim, encontrara abrigo.

Sabe, Antonieta… sempre achei que a beleza da flor estava apenas na cor. Mas foi você quem me mostrou que ela também vive no silêncio das sementes. — disse Willys, sorrindo.

Ela se aproximou e pousou a cabeça em seu ombro.

E você me ensinou que até um jardim partido pode florescer de novo, se regado com paciência… e amor.

O amor deles não precisou mais de palavras. Era feito de gestos, de silêncio partilhado, de sonhos plantados para o futuro.

Mariana, agora mais leve e dona de si, havia retornado à Provença com Sara e seus pais. As duas mantinham cartas trocadas com frequência, e haviam prometido se reencontrar no verão — quando, talvez, o destino revelasse ainda mais flores em seus próprios caminhos.

Débora, misteriosa e altiva, deixara em Paris uma confidência nas mãos de Antonieta, e partira com um sussurro ao vento: “Nem todo amor precisa ser vivido. Alguns bastam por terem existido.”

E William Stone, agora aceito como irmão, passeava entre os dois mundos — o das raízes e o das escolhas — tentando, ao seu modo, ressignificar o próprio nome.

Mas ali, na estufa onde tudo começou — entre rosas, lavandas e camélias — Willys e Maria Antonieta preparavam, juntos, o maior jardim de todos: o da eternidade.

E enquanto o mundo lá fora seguia com seus ruídos e incertezas, eles sabiam:
o amor verdadeiro, uma vez florescido, jamais se desfaz.


Carta de Willys para Maria Antonieta

Minha doce flor de estufa,

Se esta carta chegou a ti, é porque já não há dúvidas — nem sobre mim, nem sobre nós.

Lembro-me do dia em que te vi pela primeira vez…
Não eram teus olhos, nem teus passos, o que me prendeu.
Foi teu silêncio.
Ele dizia mais do que mil vozes.
E eu, homem de raízes partidas, soube naquele instante que queria morar no teu silêncio.

Durante muito tempo me escondi — de mim, da verdade, do amor.
Mas você me viu, Maria Antonieta.
Me viu inteiro, mesmo quando eu ainda era metade.

Você colheu meu nome no jardim da dúvida,
regou minha esperança com tua presença,
e esperou, com paciência, até que eu florescesse.

A carta que deixei no jardim, o poema esquecido no vento…
eram todos teus.
Sempre foram teus.

Eu sou Willys Emanuel Valmont.
Mas contigo, sou apenas
teu.

E se há um último pedido que posso fazer ao tempo,
é que ele nos conserve assim —
lado a lado, mãos entrelaçadas,
coração em repouso,
e alma em flor.

Teu para sempre,
Willys


The End